quinta-feira, setembro 30, 2021

Tirinha, matemática e compreensão

 

Laerte fez essa postagem, outro dia, no twitter:





O que achei interessante na postagem foi a explicação que o autor deu sobre o processo de criação, porque eu usei muito essa tirinha em aulas de português, até no ensino médio.

Depois da postagem fui analisar porque eu achei mais interessante usar em aulas de compreensão textual, minha área. Quais foram meus processos cognitivos na compreensão desse quadrinho? Quais os conhecimentos prévios que eu utilizei para compreender o texto?

1-Meu conhecimento prévio: Eu também odeio matemática.

2-Problemas de matemática sempre me pareceram ser escritos em uma linguagem alienígena. Eu tinha que ler umas 3/4 vezes até descobrir o que era pra fazer. E eu não me acho burra. Já fiz coisa muito mais difícil. 

 Era tão complicado, que quando fiz pedagogia (é, eu fiz isso também!) e tive que cursar matemática obrigatória junto com a turma de engenharia, ainda por cima, parei de  assistir as aulas e contratei um professor particular. Cheguei na prova final precisando tirar 7 pontos. Mas, jurei que nunca faria aquilo de novo e fui aprovada. Mas, porque eu consegui ser aprovada? A linguagem foi o processo cognitivo que eu utilizei.

Isso porque o professor particular mudou a linguagem, porque ele me fez entender o porquê de ter que aprender a calcular, por exemplo, um bendito gráfico de função e onde eu poderia usar esse tipo de conhecimento. E eu nunca usei, hahahahaaa. O computador faz, né?

3- Mas, e a tirinha? Na tirinha fica claro que o garotinho não entende a noção matemática de subtração. E por que ele não entende? Pressuponho, pela imagem retratada no quadrinho, que é uma criança na fase de alfabetização, com mais ou menos 7/8 anos. Nessa fase do desenvolvimento infantil, segundo Jean Piaget, todo o processo de aprendizagem deve ser concreto. A criança não tem ainda a habilidade cognitiva para abstrair.  No quinto quadrinho o garotinho grita:

-Eu paguei, não tenho mais!

Se ele não tem mais, então a coisa não existe. E a resposta dele está certa, segundo o raciocínio infantil dessa idade: ele lucrou 2 reais, porque não tinha mais nenhum  lápis.👍

Daí que trabalhar a tirinha em aulas de linguagem é muito lógico. Nossos alunos só entendem o que o desenvolvimento cognitivo e o conhecimento de mundo deles permite. E a tirinha permite uma grande discussão em sala. E quanto mais se discute, mais conhecimento de mundo  e mais processamento de inferências são ampliados. Depois explico melhor, em outro post, sobre processamento de inferências.

Como resolver isso? Com professores preparados para ampliar conhecimento de mundo, usando diferentes tipos de textos que envolvam novos aprendizados, que provoquem perguntas e não respostas encaixotadas. 

Experimentem usar a tirinha em aula de linguagens .Peçam aos alunos para explicar o que compreenderam. Vocês irão se surpreender.

Outra coisa: quando li essa tirinha pela primeira vez, eu entendi como uma crítica  que Laerte estava fazendo ao ensino de matemática.  Quando ele explicou o porquê de ter feito essa tirinha, eu me lembrei do livro de Umberto Eco, Obra Aberta, onde ele esclarece que o leitor/receptor do texto é que estabelece o sentido para a obra. Eu estabeleci o sentido que meu conhecimento de mundo permitia.

Isso já aconteceu com livros de literatura infantil que escrevi. Em um deles, uma fada está desempregada e  no meio da história ela começa  a ler classificados de jornal, procurando emprego. Uma coordenadora pedagógica, lá da Região Norte, me explicou que ela estava usando o livro na formação de professoras, principalmente, para demonstrar intertextualidade. Isso é,  como que dentro de um texto pode haver outros textos. E eu não pensei nada disso quando escrevi. Eu só queria contar uma história.😄



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